Definição
Amor
que se tem pela imagem de si mesmo.
Histórico
Henry-Havelock Ellis, médico inglês (1859-1939), em sua obra de sete volumes publicada entre 1897 e 1928 Studies in Psychology of Sex
foi o primeiro a utilizar o mito de Narciso para descrever uma perversão auto-erótica masculina.
Freud
utilizou o conceito pela primeira vez em um acréscimo feito em 1910 ao
seu artigo de 1905 Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade
(Edição Standard da Obra Psicológica Completa de Sigmund Freud, Ed. Imago, R.J.)
ao explicar a escolha de objeto nos homossexuais: “...tomam-se a si
mesmos como objeto sexual; partem do narcisismo e procuram jovens que se
pareçam com eles, e a quem possam amar como a mãe os amou”.
Em
1911, no Caso Schreber (idem, vol. XII) Freud se referiu ao narcisismo
primário como a fase
da evolução sexual intermediária entre o auto-erotismo e o amor objetal.
O indivíduo se toma, a seu próprio corpo, como objeto de amor, o que
permite uma primeira unificação das pulsões sexuais.
Em
seu artigo de 1914 Sobre o Narcisismo: uma introdução (ibidem, vol. XIV), o conceito é
formalmente introduzido na teoria da sexualidade
entre o auto-erotismo e
o amor objetal. Enquanto que no primeiro as pulsões sexuais se
satisfazem de forma anárquica, independentemente uma das outras, no
narcisismo é o ego em sua totalidade que é tomado como objeto de
investimento libidinal. Só posteriormente a libido será investida nos
objetos. Assim, cria-se um equilibrio entre o investimento no
ego e nos objetos, com a possibilidade da libido reinvestir o ego desinvestindo o
objeto. Essa nova teorização tem amplas conseqüências nas concepções
freudianas:
a) Em
relação ao funcionamento mental, e em uma perspectiva genética, é
justamente este investimento no ego, chamado por Freud de narcisismo
primário, que o constitui como uma unidade psíquica, coincidindo com a
constituição do esquema corporal. Saindo da perspectiva energética e
entrando na da intersubjetividade, Jaques Lacan (1901-1981) vai
relacionar este primeiro momento de formação do ego como a experiência
narcísica fundamental. Em seu texto de 1949 Le stade de mirroir comme
formateur de la fonction du Je telle qu’elle nous est révéllée dans
l’expérience psychanalytique, o ego se define por uma
identificação
com a imagem do outro. O narcisismo seria, deste ponto de vista, a
interiorização de uma relação (“estágio do
espelho”).
b) O
conceito de narcisismo também permitiu a Freud entender o movimento de
desligamento da realidade que está presente nas doenças mentais. Frente
à realidade frustrante, dois caminhos se abrem para a libido: reinvestir
os objetos da fantasia (neurose) ou reinvestir o próprio eu (psicose).
Clínica:
Os
pacientes narcísicos apresentam um conceito muito inflado de
si mesmos
e, contraditoriamente, uma necessidade enorme de receberem homenagens
dos outros. Em suas interações com os outros são exageradamente
auto-referentes e têm uma grande necessidade de serem amados e
admirados. Sentem-se com direito a tudo e têm fantasias de onisciência,
de onipotência e de perfeição. Seus objetos são sempre
idealizados e seu
estado de espírito varia da exaltação, quando a inflação de sua
auto-estima é apoiada, à depressão, raiva ou ao ódio ("fúria narcísisca")
quando a auto-estima é danificada. São muito sensíveis às frustrações e
dificuldades da vida, as quais são vividas como verdadeiras feridas em
sua auto-estima (“feridas narcísicas”).
Como
a retração da libido para o eu, que caracteriza o narcisismo
secundário, implica
sempre em algum nível de desligamento da realidade os pacientes que
apresentam estas características são também chamados de “borderline”.
Para
distinguir melhor a auto-estima dos estados narcísicos, Otto Kernberg
fez uma diferença entre narcisismo normal e narcisismo patológico.
Enquanto que o narcisismo normal leva a uma auto consideração continuada
e realista, a aspirações e ideiais maduros e se faz acompanhar pela
capacidade de relações profundas, o patológico se acompanha de prejuízo
das capacidades de ter interesse, empatia e amor pelos outros.
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