Resumo da Reunião Clínica
 

Um homem de quase sessenta anos, casado, foi internado para diagnóstico e tratamento de uma lesão no tórax surgida há um ano. Durante a internação recebeu o diagnóstico de carcinoma espinocelular, que, pelo relato do paciente, parecia ser a menor das suas tragédias. Pessoa de origem humilde e bastante consciente das desigualdades sociais, que veio para o Rio trabalhar ainda muito jovem, aqui se envolveu com uma moça, mas fugiu para outro estado ao ser pressionado por ela a casar. Apresentou alguns episódios de agitação psicomotora e hetero-agressividade justificados como decorrentes de um “trabalho” feito pela ex-namorada e que acabaram por lhe levar a uma internação psiquiátrica. Alguns anos depois trouxe uma moça de sua cidade natal para casar, teve seus quatro filhos, dos quais perdeu dois ainda na primeira infância e exerceu diferentes atividades profissionais, sempre muito consciente das injustiças sociais. Ao chegar à meia-idade foi despedido, ficou alguns anos sem conseguir trabalho, precisou ser ajudado por familiares e acabou tendo que se sujeitar a ser explorado trabalhando sem vínculo empregatício, com baixos salários e em péssimas condições de higiene e moradia. Permanece internado para pesquisa de tumores metastáticos e tratamento.

Por ter conseguido manter sua dignidade pessoal em meio a uma vida marcada pela injustiça e desigualdade, o paciente acabou lembrando o personagem central do livro “Os Miseráveis” de Victor Hugo e a discussão do caso girou em torno dos aspectos contratransferenciais mobilizados nos atendimentos que envolvem miséria, loucura e morte.

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