Uma mulher de quase cinqüenta anos, casada, mãe de três filhos dos quais o primeiro
morreu de
desidratação recém nascido, foi internada com um eczema que teve
inicio há alguns meses ao usar um brinco que ganhara de presente das irmãs quando
voltava para o Rio encontrar a família após ter ido se tratar de depressão em sua
cidade natal. O atendimento pela Psicologia
Médica foi solicitado pela equipe da
enfermaria porque ela dizia que tudo decorria do fato dela ter depressões. Contou
ter sofrido quatro episódios depressivos: o primeiro, quando o marido, então ainda
seu noivo, desistiu temporariamente de com ela casar; o segundo, após o nascimento
do seu primeiro filho, quando não conseguiu cuidar dele e da casa sem o marido,
que na época trabalhava em outro estado. A paciente disse ter melhorado quando o
marido voltou para casa e foi este filho que morreu de desidratação. A terceira
crise depressiva aconteceu quando trabalhava com o marido: desta vez não conseguiu
levar adiante as tarefas laborativas. E a última ocorreu recentemente quando viu
que a filha estava tendo problemas no trabalho e disso inferiu que também a filha
era dada a ter depressões.
Também nos atendimentos da Psicologia
Médica a paciente só se referia aos seus episódios depressivos, a eles sempre voltando
para justificar todos os seus problemas físicos e pessoais, assim como suas dificuldades
com a vida.
O primeiro tema a ser discutido foi a relação entre doenças orgânicas e dificuldades
no processo de simbolização. Foi lembrado que isso vem sendo pensado há muitos
anos a partir da idéia de que aquilo que não se expressa através de palavras extravasa,
repercute, no corpo. Foi assim com a idéia de
neurose atual que Freud formulou
para as doenças mentais relacionadas com o desempenho orgânico, com o conceito de
“pensamento operatório” que Pierre Marty desenvolveu para descrever um determinado
tipo de funcionamento mental que seria acompanhado de fenômenos patológicos orgânicos
e com a idéia de “alexitimia” que designa a incapacidade de expressar sentimentos
e que Peter Sifneos utilizou para tentar compreender certos fenômenos psicossomáticos.
Em nosso serviço, temos observado que a repercussão orgânica de certos problemas
emocionais passa pelo mecanismo do
estresse que, nas pessoas com dificuldades
no processo de simbolização, é desencadeado pela
angústia.
Assim, por provocar angústia, aquilo que
não consegue se expressar desencadeia o mecanismo do estresse, a partir do
qual os pontos vulneráveis do organismo, por predisposição genética, problemas na
regulação homeostática, deficiências imunológicas ou outros mais, podem ser atingidos
dando origem a doenças somáticas.
Em seguida, foi salientado
que a psicodinâmica da paciente girava em torno de uma importante dificuldade
simbólica geradora da limitação que ela apresentava em integrar as experiências
por ela mesma vividas e o uso que ela fazia do
diagnóstico de depressão para se
excluir de todas as relações e atividades e assim evitar o sofrimento e a angústia
que costuma ser desencadeada nessas situações.
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