Resumo de Reunião Clínica
 

Uma paciente de quase 40 anos, portadora de esclerose múltipla, doença neurológica crônica, incapacitante e de evolução fatal, vem sendo acompanhada desde sua primeira internação há quase dois anos. A doença teve início três anos antes, com perda súbita e parcial da visão e perda parcial da locomoção. Em sua primeira internação, a paciente mostrou-se otimista e, por vezes, excessivamente otimista, quase não conseguindo lidar com as mudanças que estavam acontecendo em sua vida a partir do seu adoecimento. Foi reinternada dois meses depois devido a piora de seu quadro clínico: perdeu a força dos membros inferiores e superiores, quase não mais conseguindo movê-los. Seu estado de saúde havia piorado drásticamente, ficou completamente dependente de ajuda externa e deprimiu-se. A partir de uma interconsulta, foi autorizado que a paciente recebesse a visita de seus familiares (pais, marido e filhos) a qualquer hora e que pudesse também receber alimentação e roupas de casa. Três meses depois, seu quadro clínico sofreu nova piora: a paciente perdeu quase completamente a visão, passando a enxergar apenas vultos, perdeu completamente o movimento dos membros, ficando paralisada do pescoço para baixo e também perdeu o controle dos esfíncteres. Estava desanimada e muito triste com o pensamento de não poder ver a filha caçula, de 5 anos, crescer. Pela primeira vez falou em morte e contou que em casa começou a ditar suas receitas culinárias para a filha. Quatro meses depois, a paciente teve duas internações bem curtas para tratamento de escaras de decúbito e tratamento de importante quadro infeccioso. Seis meses depois, a paciente teve nova internação. Seu estado de saúde era bastante precário devido a persistência do quadro infeccioso. Bastante desesperançada, a paciente perguntou à sua terapeuta se poderia ditar uma carta de despedida para a filha onde ela poderia falar para a filha sobre crescer, se tornar mulher, casar e ter filhos.

A discussão foi iniciada ressaltando-se a importante função terapêutica de acompanhar pacientes em situações desesperadoras sem se desesperar. Nessas situações, não raramente, a equipe de saúde costuma se retirar. Em seguida, detalhou-se a importância de se ajudar quem parte a encontrar maneiras de permanecer na lembrança de quem fica (no caso, as receitas e a carta de despedida) como forma de diminuir a solidão do momento e amenizar a angústia de morte. Afirmou-se que o futuro dos pacientes terminais está nas lembranças de quem fica. Em seguida, foi questionado se a atitude inicial da paciente foi maníaca ou esperançosa. Finalmente, foi discutido o limite da atuação da Psicologia Médica. Nesses casos, deve-se ir até onde não se fizer mal ao paciente. Empurrar a realidade à força para o paciente, impondo uma maior consciência da morte, seria iatrogênico. Como fez a terapeuta, deve-se reforçar os vínculos do paciente.

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